“Foram em cima de nossos cartazes, torceram nossos pulsos, deram golpes sutis e acertaram mulheres”, lembra André Dutra, um dos coordenadores do grupo que liderou a manifestação “Fora Sarney”, ontem, no Senado Federal. Dutra se referiu aos agentes da Polícia Legislativa, que atualmente são alvo de olhares desconfiados, inclusive de senadores. Estudante, servidor público e ativista da juventude do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Dutra conta em entrevista ao Contas Abertas (CA) como ele e outros jovens foram tratados durante a manifestação do grupo Coletivo Independente de Manifestação e Ativismo (CIMA). Ele também garante que, depois da concentração sobre Sarney, o movimento pedirá a saída dos membros da Mesa Diretora e dos senadores Renan Calheiros e Fernando Collor.
Sobre a confusão de ontem no Senado, “falaram em ligar para nossos patrões, em ir atrás para tirar nossos empregos e daí para pior”, diz. Dutra – que aparece em pé, à direita (foto) – conta que foram necessárias três horas, quatro senadores e uma deputada para que saíssem do que chama de calabouço. Depois da experiência, para ele só resta o apelo: “que o povo se junte nessa causa, porque se dez jovens conseguiram fazer aquilo ontem, dentro do Senado, com toda a repercussão que teve, mobilizando cinco parlamentares federais, imaginem o que milhares de pessoas não podem fazer?!”. Pela proporcionalidade apresentada pelo jovem de 23 anos, se a cada dez pessoas, cinco parlamentares forem mobilizados, bastaria 1.200 manifestantes para alcançar todos os senadores e deputados.
CA - Quem foram os agentes da Polícia Legislativa que agiram com truculência contra os manifestantes do CIMA?
Dutra - Nós não temos nomes de ninguém, mas concordo com a posição dos parlamentares que estiveram conosco ontem de pedir o afastamento do chefe da Polícia Legislativa. Fomos muito maltratados, foram 20 minutos de ameaças e agressões psicológicas. Logo depois os senadores Eduardo Suplicy, Cristovam Buarque e José Nery chegaram e foi visível a mudança de postura dos agentes e do chefe da segurança que nos havia dado voz de prisão. Ele (chefe da segurança) não teve trato nenhum para lidar com o momento de tensão. Recebemos a orientação de alguns advogados para prestar queixa ontem, mas o assunto ainda será discutido entre o grupo do CIMA antes de uma decisão.
CA - O fato de o movimento ter a iniciativa partidária não prejudica a credibilidade das manifestações?
Dutra - Não é porque eu sou do partido que eu vou seguir só as linhas do partido, até porque ninguém é 100% partidário. Eu não participei da movimentação como um ativista da juventude do PDT, mas como integrante do CIMA e como povo brasileiro. Tínhamos ali pessoas sem partido algum que se uniram a causa e acredito que isso não prejudica de maneira alguma a credibilidade da nossa reivindicação.
Inclusive o nome do grupo sugere a coletividade independente justamente para não ficar atrelado a nenhum partido. Eu, por exemplo, quase nunca digo que sou funcionário público do Governo do Distrito Federal há mais de três anos, mas eu estava na manifestação como cidadão brasileiro indignado. Hoje, os funcionários públicos têm um papel muito importante, mas eles não são ativistas políticos. O que nós fazemos é um ativismo político suprapartidário.
CA - Quem é o grupo CIMA, que encabeçou o movimento de ontem?
Dutra - O grupo começou na internet por causa do “Fora Sarney” e nós resolvemos nos juntar. A maioria são estudantes, uma parte ligada a algum partido e a maioria não ligada a nenhum. Como a causa é suprapartidária, a gente resolveu fazer um movimento independente. Não tem nenhum coordenador, embora uma espécie de coordenação de cinco a sete pessoas esteja sempre à frente das idéias, mas nós tomamos as decisões em conjunto. Foi criado há menos de um mês. A primeira marcha foi em 1º de julho. Temos um grupo de e-mails com aproximadamente 30 pessoas.
CA - Quais os objetivos do CIMA?
Dutra - O ‘Fora Sarney’ é só o começo. Mas queremos também a saída de todos os integrantes da Mesa Diretora, de senadores como Fernando Collor, Renan Calheiros e outros que têm os seus nomes na lama há muitos anos. Existem ainda senadores que são contra o Sarney, mas nós não queremos que eles estejam lá dentro. Também estamos de olho na Câmara dos Deputados e esperamos apenas um momento propício. Os deputados que nos esperem.
CA - O grupo pretende ser uma nova geração de “caras-pintadas”?
Dutra - Nós pensamos em relançar os ‘caras-pintadas’ ontem. Chegamos a comprar as tintas (verde e amarela), mas não usamos. Creio que são dois momentos distintos da história, dois momentos de extrema depressão política, mas a nossa geração é uma geração diferente – uma sociedade que já nasceu livre e acomodada. O que nós tentamos é remontar um contexto de reviver a boa política que nós perdemos ao longo dos 20 anos da jovem democracia.
CA - Como você vê a situação do presidente do Senado, José Sarney?
Dutra - Vejo o Sarney como um retrocesso para a política do Brasil. A saída dele é só a ponta do iceberg, mas é também altamente representativa, por todo o coronelismo e pela práxis da política pública que ele utiliza ali. No momento pelo qual passamos, com tantos eventos escandalosos que se confundem com a política brasileira e colocam em cheque a credibilidade do Senado, o Conselho de Ética não pode ficar inerte frente aos desmandos de todos os senadores, muito menos pode agir com utilitarismo e pessoalismo, como fizeram reiteradamente algumas autoridades ao defender o presidente da casa José Sarney.
O Senado é muito maior do que o indivíduo Sarney e não pode ser leiloado para garantir as pretensões eleitorais de qualquer político. Pairam dúvidas significativas sobre a conduta ética e moral do presidente da Casa, cujo dever é colaborar com o esclarecimento das denúncias oferecidas contra ele. Por isso ele deve se afastar do cargo, para permitir uma melhor condução das investigações.
Milton Júnior
Do Contas Abertas
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